O nosso
Ele fala pouco, eu falo por nós dois. Eu reclamo, peço ajuda, não sei o que fazer. Ele ouve, pensa e diz a coisa certa.
Meu pai e eu nunca tivemos uma fase ruim. Aquele momento na pré-adolescência em que a filha se revolta e se tranca no quarto sem querer conversar, não existiu. Não brigamos quando eu disse que queria fazer jornalismo. E ele também não pediu para que seguisse outra carreira ou pensasse melhor na minha decisão.
Meu pai é como o pai de todo mundo. A diferença é que ele é meu pai. E nós juntos, somos melhores. Ele me acalma, diz que vai tudo vai dar certo e eu fico bem. Eu mudo de canal, ele se irrita. Ele coloca em um filme chato, eu enlouqueço. No fim, assistimos juntos e comentamos o enredo com minha mãe.
Meu pai não pergunta. Ele espera até que eu encontre o momento certo para falar. Ele diz não gostar de presentes mas se chateia quando não os recebe. Nos almoços em família, ele cuida do churrasco e da água da piscina. Eu faço piada, puxo sua orelha e ele se diverte.
Meu pai gosta quando eu ligo contando que estou no feliz no trabalho, que eu tenho novidades e que os sonhos estão dando certo. Ele não gosta quando eu aviso que vou à balada e que não tenho tempo para ir à academia.
Meu pai e eu não moramos mais na mesma cidade, mas nos falamos todos os dias. Quando não por telefone, por internet. Ele também é virtual e sempre aparece no MSN no meio do trabalho para perguntar como está o meu dia.
Não moramos mais juntos. Ele sente falta dos meus tênis na sala. Eu sinto falta da sua preocupação constante em querer saber se eu tranquei a porta de casa e jantei direito.
Meu pai e eu somos amigos. Melhores amigos. E eu tenho saudades. Este é o primeiro Dia dos Pais em que não estaremos no mesmo lugar. Em que eu não vou ver sua cara de bravo ao receber um pacote embrulhado e depois o seu sorriso ao perceber que era tudo o que ele queria ganhar. Não almoçaremos em um restaurante da cidade e eu não roubarei um pedaço do seu chocolate amargo.
Mas neste dia, ele estará perto de mim. Como todos os dias, como qualquer dia. Não enviei presente, mas fiz um vídeo com tudo o que é nosso. O amor, a amizade, o meu pai e a minha família. O que há de mais raro e o que realmente importa. Tudo o que é nosso e não é possível explicar.
Posts recentes
Ver tudohoje estava falando com a minha irmã sobre notícias tristes do dia a dia que guardamos em cantos escuros dentro do cérebro sem se dar...
Eu não estou conseguindo fazer planos nesta pandemia. Desculpa. Não tô estudando línguas, fazendo cursos online, planejando viagens...
no auge da pandemia, em março, um hospital que é nosso cliente há muito anos nos chamou para fazermos gravações sobre conteúdo de...
Comments